terça-feira, 29 de junho de 2010

Trago mar e saudades

     ...Trago mar e saudades...


A esteira, o poente, a linha indistinta do horizonte, todo esse mar que se estende à nossa volta e lá longe se desfaz para além da nossa vista, é a mesma imensidão, a mesma dormência das saudades. 


São contrários que se tocam.


 É enorme este mar por onde queremos ficar, e imensas são as saudades que a ele se pedem para nos fazer chegar. No mar, as horas passam lentas e os dias lestos. 


Há um vai-e-vem, nele, em nós, que traz a métrica do tempo confundida: de um lado esse tanto sentir que se ocupa das horas, do outro, nós, cada vez mais inertes, a pairar sobre os dias que passam. 


Nas saudades são as horas que se sucedem apressadas, sem nada que as preencha, e os dias que se arrastam, com uma indolência sádica que teima em nos manter longe. 


E no entanto, o mar e as saudades, quando brincam com o tempo que temos em nós, tornam-se a mesma coisa: aos poucos perdemos a noção da nossa identidade, até já quase só sermos o que sentimos do mar, e aos poucos, acabamos por nos resignar a ser apenas, minuto após minuto, o ponto de onde todo aquele azul se lança e as saudades se encurtam. 


Há tanto mar por diante e tanto deles em mim, que tudo o resto, cheio das coisas de absoluta importância que trazia, afinal se torna um sentir vazado em tanta infinidade. E já nada mais me é tão importante. Tornei-me longínquo, lá de onde nunca saí. 


Tornei-me o mar, a querer apertar a distância de onde o resto de mim ficou. 


Trago apenas mar e saudades, e essas são coisas que não sei (d)escrever. Tentá-lo seria mesmo uma impostura. 


Tanta ondulação como se o barco continuasse a navegar... se calhar, na rede que o barco trouxe está lá a parte apartada de ti. 


Desconheço autoria.

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial